sábado, 31 de julho de 2010

NÃO SEI SE VOU POR DENTRO OU VOU POR FORA


O episódio que vou contar se passou no rio Taquari e envolve uma falsa ilha, que só se formava quando o rio aumentava de nível durante o período de chuvaradas, formando desta maneira mais um braço. Meu pai conheceu o personagem desta história, mas como eu não o conheci, usarei um nome fictício, mas que ela foi fato foi!

Quando essa história aconteceu, eram muito usados na navegação fluvial uns pequenos barcos de carga com motor movido à gasolina, que eram chamados de “gasolinas”.

Naquele tempo, tudo o que se relacionasse com motores e gasolina era muito caro, por esse motivo os barqueiros que transportavam mercadorias entre o interior e Porto Alegre aproveitavam o mais que podiam as correntezas do rio Taquari, preferindo os tempos das cheias.

Foi numa destas ocasiões que um Joaquim da Silva qualquer, vinha com seu “gasolina” carregado de carga rio abaixo, com o motor parado e aproveitando a correnteza. Mas, num determinado ponto do rio, havia uma ilha, e aí o barqueiro olhou para um lado, olhou para o outro, para ver em qual dos dois a correnteza estava mais forte, ficando naquela dúvida: NÃO SEI SE VOU POR DENTRO OU VOU POR FORA... NÃO SEI SE VOU POR DENTRO OU VOU POR FORA...

Sem escolher a tempo, acabou embicando a proa do barco na ponta ilha e encalhou!

Assim, ele precisou esperar que viesse outro barco que pudesse lhe prestar socorro e o puchasse para fora, a fim de continuar rio abaixo até seu destino.

QUE BARBARIDADE!!

Fonte da ilustração: Espaço Rudi Santos

Continue lendo...

sábado, 3 de julho de 2010

OS TOUROS DO SÍTIO FRANCK


O sítio Franck situa-se na cidade de Bento Gonçalves, RS. Até o início dos anos 90 ele foi utilizado para produção de gado leiteiro e leite. Desse tempo, há algumas histórias e aventuras a contar.

Uma das práticas que cometemos durante o período que exploramos a produção de leite aqui no sítio Franck foi a criação de touros para a cobertura de vacas, das quais não desejávamos aproveitar as crias.

Em vez de inseminação artificial, utilizávamos a cobertura natural. Dessa forma, aparentemente, fazíamos economia, pois a inseminação artificial era cara, principalmente quando se usava semem de touros provados e não fazia sentido utilizarmos um semem especial em vacas das quais não queríamos aproveitar as crias.

Como resultado dessa opção houve a necessidade de criarmos alguns touros e com isso corremos alguns riscos que poderiam ter custado bem mais que as inseminações artificiais. Para terem uma idéia dos perigos, vamos contar algumas histórias dá passagem destes touros por aqui.

O primeiro touro que deixou sua marca chamava-se LINDO. Sua beleza se devia a uma mãe mestiça holandesa e a um pai puro Jersey de inseminação. Antes de alguém saber que o Lindo estava ficando brabo, eu e meu pai estávamos caminhando pela avenida dos ciprestes, de um lado da taipa, e o lindo nos acompanhando do outro lado. Em certa altura da caminhada, eu disse para meu pai: “Vamos voltar porque não estou gostando do jeito e da cara deste touro, além disso, a taipa ali mais adiante está mais baixa e é perigoso para o senhor que não pode mais correr”.


Dito isso, voltamos com o touro sempre nos acompanhando do outro lado da taipa. Quando chegamos num local aonde a taipa era mais alta, tentei espantar o touro, mas ele nem se mexeu. Mais tarde quando já havíamos chegado a casa, o Diamantino, nosso empregado que tratava do rebanho nessa época, veio nos avisar que o Lindo tinha pulado a taipa, bem no lugar que eu tinha tentado espantá-lo. Ele havia pulado sem tocar com os pés em cima da mesma.

Até a gente se convencer que o Lindo era muito perigoso, apesar de ser um touro pequeno e meio sangue Jersey, ele pulou muita taipa e muita cerca, nestas ocasiões só o Diamantino conseguia lidar com ele, porque ele não tinha medo e chegava perto, e usando uma vara com o pegador de argola na ponta, dominava o touro. Assim, enquanto o Lindo era novo tudo bem ele pulava, mas podia ser controlado com facilidade.

Porém, depois de completar três anos, o Lindo virou um bicho muito brabo, daqueles que só com o olhar te botava para correr e ninguém aqui do sítio conseguia mais lidar com ele sozinho, pois chegou o ponto que mesmo agarrado pelo focinho com a vara, ele vinha para cima do tratador e era preciso atar uma corda nas guampas para detê-lo. Assim, para lidar com o Lindo, eram necessárias duas ou três pessoas, uma manuseando o pegador de argola na ponta de uma vara e as outras duas segurando as cordas atadas nas guampas.

Uma nova medida de segurança que tomamos foi construir para o Lindo um cercado e estrebaria especial. Ele ficava preso o dia todo nessa estrebaria especial e “invulnerável”, as vacas que entravam no cio eram levadas até ele. Porém, houve um dia em que escapou desse local “invulnerável” e foi um sufoco para prendê-lo novamente, pois descobrimos que não tinha altura de taipa que o segurasse, assim todo mundo correu para dentro de abrigos ou casas e ele ficou solto. Finalmente, alguém se lembrou de botar forragem na sua estrebaria e ele voltou para lá sozinho, sendo trancafiado. Dali foi encaminhado para o açougue, já que era perigoso de mais e havia muitas crianças que circulavam pelo sítio, a faca do açougueiro foi à solução, ainda bem que não pegou ninguém. MAS QUE ASSUSTOU, ASSUSTOU!

Depois tivemos um tourinho sem eira nem beira e nem nome, pequeno, filho de uma vaca que seria descartada logo, mas que para a monta natural de crias descartáveis, até que vinha a calhar. Nosso responsável pelo rebanho leiteiro na época era o José Crespim, que chamávamos apenas de Zé.

O Zé movimentava esse tourinho como queria, mas alertado por mim, usava bem preso ao pulso do braço direito por uma laçada de couro um porrete. Num dia em que ele foi buscar o touro no potreiro de cima, prendeu o bicho pela argola do nariz, e foi trazendo-o, até que ouviu um barulho estranho, a primeira coisa que fez foi quadrar o corpo, o Zé tinha corpo de atleta, e era ligeiro, mas assim mesmo o touro fez um risco na sua barriga, COM A GUAMPA.

Não satisfeito, o tourinho se lançou noutra investida contra o Zé. Nessa o touro começou a apanhar com o porrete, mas, assim mesmo, fez outro risco na barriga do Zé, que continuou batendo. Mas o touro não parava de tentar atacar e continuou a apanhar, tanto que ficou cego de um olho. Ola Zé valente! Nessa luta, ele trouxe o bicho até onde a vaca estava esperando para ser coberta e ficou preso até ir para o açougue.


Depois tivemos um touro chamado AB. Esse era um terneiro puro holandês que ganhamos do Aristides Bertuol, como os outros, enquanto novo foi muito bom, mas depois de completar três anos, ninguém mais segurava o bicho, pois ele era um baita dum touro. O evento mais sério mesmo ocorrido com o AB, que eu me lembre, foi uma corrida que ele deu no Arsilio, que era nosso entregador de leite.

O Arsilio ele não acreditava no que o Mário dizia (quem tratava e tirava leite dos animais nesta época era o Mário) e foi se meter a facão sem cabo contra o touro, que havia escapado do cercado. Ele teve que correr bastante, porque o bicho vinha atrás! Não deu outra, açougue com ele, do AB em diante não quis mais criar touros.

Porém depois do AB tivemos mais um touro o Pretinho, até as suas aspas eram escuras! Ele era mestiço de zebu (girolande), resultado do cruzamento de uma das nossas vacas que tinha puro sangue holandês inseminada de um touro Gir. Esperávamos por uma fêmea, mas em vez de vaca nasceu um tourinho bem pretinho, ele era tão bonito que resolvemos criar e em pouco tempo se tornou uma beleza de touro, grande, reluzente, brincalhão, subia em cima das taipas com uma facilidade danada.

Um dia eu o peguei encima de uma taipa comendo laranja comum, ainda está lá o pedaço derrubado de taipa por onde ele subia e a laranjeira da qual comia os frutos. Essa taipa nuca mais foi arrumada por falta de necessidade, pois já não separava coisa nenhuma porque os potreiros foram unidos em um só.

Por causa do costume do Pretinho de subir em taipas, tivemos que unir por tapumes, uma porteira com um cipreste, lugar que ele usava para sair do potreiro e atingir as pastagens cultivadas. Porém, chegou um ponto que não deu mais, pois ele era inconfinável e mesmo sem ter se tornado muito brabo a solução foi o matadouro do Tomasini, já que as histórias dos touros anteriores nos alertavam sobre os perigos que poderiam surgir. Assim, este touro que nunca correu atrás de ninguém, pelo que eu me lembre, foi eliminado antes de se tornar brabo, por precaução.

Atualmente, já não trabalhamos com produção de leite e nosso sítio tornou-se apenas moradia com uma pequena criação de ovelhas e vacas, porém as ruínas da estrebaria dos touros sem telhado e sem porta ainda estão lá para relembrar estas histórias. MAS, APESAR DOS TOUROS BRABOS, COM TODOS OS ERROS E ACERTOS, ESTAMOS AQUI VIVOS E HÁ MAIS DE CINQUENTA ANOS.


Imagem inicial: Aguada de nanquim de Pablo Picasso disponibilizada Ignez Ferraz  no artigo “Espanha: Roteiro de analogias artísticas”. Segundo a autora: Em 1957 o pintor homenageou o famoso matador Jose Delgado com uma série de 26 aguadas de nanquim denominada “Tauromaquia.

Continue lendo...

Creative Commons License
Esta obra esta licenciada sob uma Licenca Creative Commons.